quinta-feira, 28 de agosto de 2008

O espírito das eleições em cometas, abelhas e sapateado

As propagandas via televisão têm grande repercussão. Às vezes são melhores que os programas que patrocinam. A história da TV pontua as agências como produtoras independentes e definitivas na evolução do veículo pois criavam parte da programação. Faustão anuncia os intervalos comerciais como “o show da publicidade brasileira”. Elas estão no imaginário do povo. Difícil esquecer dos filmes das gotinhas Esso; os porquinhos dançando chá-chá-chá, nas Casas da Banha; o lendário “Quem bate? É o friiio...” ou “Liberdade é uma calça velha, azul e desbotada...” e as formiguinhas enlouquecidas com um aparelho de som onde batiam e voavam. Santa criatividade!

Classificada por Quesnel e apontada como “máquina de lavagem cerebral, empresa de imbecilização e de embrutecimento das massas” o conceito de publicidade difere do de propaganda, nas discussões dos profissionais. Propaganda é a divulgação de idéias, de modo persuasivo, com nítidas intenções ideológicas (político-partidárias, religiosas, etc) e a publicidade como divulgação de produtos por anúncios comerciais”. Para o telespectador são utilizadas com o mesmo sentido.

Bom humor e absurdo

Tem ar de novidade a impactante campanha publicitária, voluntária, criada pela W/Brasil para o TSE buscando a reflexão dos eleitores na escolha dos candidatos nas Eleições 2008. São seis filmes veiculados em duas fases e que promovem a conscientização dos brasileiros. Na primeira fase os filmes “Cometa” e “Carro” evoluem em cima do conceito de que 4 anos demoram muito a passar, principalmente quando as coisas não vão bem. Nos outros filmes, “Abelha”,“Sapateado”, “Círculos” e “Emoções” o bom humor e apelo ao absurdo nas mensagens da mulher que anda em círculos, ou do celular com mensagem emotiva, mostram o perfil light do ato de votar tão importante e pouco esclarecido aos eleitores. A conotação abre o leque de significados. O mundo fictício para revelar o mundo verdade.Uma novidade bem-vinda do TSE.

A metáfora utilizada como estratégia de persuasão, a arte de convencer, é recurso precioso, pois torna o telespectador interativo na decodificação das mensagens. Ele constroe o seu entendimento na percepção da associação dos comportamentos dos filmes com o seu universo. O eleitor, em casa, em qualquer canto do país, seja doutor ou lavrador, várias vezes ao dia, identifica o prefeito incompetente que vira a abelha irritante no ouvido ou “sapateia, sapateia” e a cidade não cresce. Umberto Eco cita que “a comunicação publicitária fala uma linguagem já falada, e exatamente por isso se torna compreensível”. Depois de ver na TV, na praça, o povo diz “O fulano (o prefeito) é igualzinho...”

Texto ou imagem?

Nessa campanha o que é mais forte? A imagem ou a redação? A força da peça pode estar na simbiose da mensagem icônica (da imagem) e da mensagem escritural (o texto escrito). Segundo Luiz Carlos Yasbeck, em “A arte dos slogans”, “Barthes vai levantar a necessidade de estudar o conjunto texto/imagem quando afirma que uma das operações mais importantes se dá nessa confluência. Assim, o texto escrito ou fornece a chave do sentido-conduzindo a leitura da imagem – ou a destaca em relevo, explicando-a, guiando a interpretação”.

Segundo o autor a imagem traz vários significados e o texto dá unidade e o sentido da campanha chega claro, intencional. E aqui, especificamente, cruel. O rei está nu.

Ciranda da comparação

Se a publicidade pode transformar o relógio em jóia, o morro em condomínio de luxo, ou vender às mulheres frascos expressos de capital juventude, a campanha das Eleições 2008 esclarece, educa, estimula o raciocínio e promove o esclarecimento sobre administrações equivocadas e capengas. A possibilidade de mudança no cenário das prefeituras favorece os candidatos que não estão na administração, promove a reflexão para que as pessoas prestem mais atenção na política, e que, se a safra de prefeitos e vereadores é ruim, está na hora de mudar.

A análise remete ao estímulo ou mensagem oculta para votar em candidatos que não estão no poder. Não se deve prestigiar os que estão nos gabinetes, na ciranda da comparação, no foco, na visibilidade da lente? E comparar com nova possibilidade de governo, de renovação, é terreno fértil na preparação do eleitorado para as eleições em 5 de outubro. E para a votação de presidente em 2010.

Políticos chegam como cometas, de tempo em tempo, viram abelhas no ouvido, fazem o povo andar em círculos, sapateiam para lá e para cá e só nos emocionam.

*Produzido a partir de debate com alunos de jornalismo da Universo/Juiz de Fora(MG)

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Ai, que saudades que eu tenho...


Com dois anos. Me lembro como se fosse hoje...

terça-feira, 12 de agosto de 2008

A voz fingida dos atores


A sonoridade vocal é determinante na carreira do profissional do audiovisual. Jornalistas, atores, cantores têm no requinte da emissão do texto, elemento definitivo para o mercado de trabalho. As vozes matizadas fizeram a história de centenas de nomes do rádio como Roberto Faissal, Daisy Lúcidi, Heron Domingues, Lúcia Helena, César Ladeira e Ísis de Oliveira. A MPB se renova em timbres belíssimos. Ney Matogrosso encanta gerações! A história não esquece de mitos como Vicente Celestino, Elizete Cardoso, Dalva de Oliveira, Vanusa, Elis Regina, Carlos Galhardo, Maysa, Cauby, Marlene e Emilinha Borba. A voz de veludo de Íris Letieri é conforto e alivio de tensões nos embarques do aeroporto do Rio. No telejornalismo a voz é complemento da competência profissional. Cid Moreira, Hilton Gomes, Heron Domingues, Márcia Mendes, Leda Nagle, Leila Richers, Sônia Maria, Carlos Nascimento, Berto Filho, Gioconda Brasil, Celso Freitas, Renata Vasconcelos, Ana Paula Padrão são ícones de ontem e hoje. E os atores? Ainda nessa edição...

Na obra “Réflexions sur le Théatre”, J. L. Barrault compara a voz do ator a uma orquestra: “o ator, nas suas mudanças de voz faz vibrar alternadamente seus instrumentos de corda, suas madeiras, seus metais, e mesmo sua percussão. É por meio dessas mudanças que a vida aparece, o ator manifesta sua presença”. A bela voz define parte do sucesso da carreira na TV, e teatro.O rádio está se desligando dessa tradição. Atrizes com voz grave, semitonada, impostada e com inflexões variadas atuam na dramaturgia como referência. As vozes femininas agudas ou infantis são mais comuns nos programas de humor.

Michel Chion mostra a que a voz off é a voz do saber e poder no cinema, pois domina as imagens e proporciona sentido que vai além do que elas mostram. Carrega potencial de sedução e que, nove entre dez vezes, a voz na publicidade e documentários é masculina. O timbre feminino não é conclusivo deixando a frase em aberto, exceto em poucos produtos raros dirigidos à clientela feminina. Provoca ruído na assimilação. Atores que não inflexionam corretamente fazem uma novela e não voltam mais. Repórteres que não desenham a curva melódica das frases nas notícias não fazem carreira em rede. Não encontraram seus tons naturais. Fica artificial. E os locutores de futebol no rádio? Disputam olimpíada sonora a cada transmissão.

Os manuais de voz e dicção descobriram Legouvé e suas classificações para os timbres conhecidos. A voz de ouro é resplandecente e transmite alegria e intensa emotividade, assim Cid Moreira, Fábio Perez, Fernanda Montenegro, Glória Menezes e Sílvio Santos poderiam formar um coral. A voz de bronze é a voz de protagonistas de novelas. Tão grave como a voz de ouro, porém mais grave e volumosa remete a Christiane Torloni, Vera Fischer, os Gonzaga: Castro e Reinaldo, Lombardi, Paulo César Pereio e Dina Sfat. Já Eva Vilma, Cássia Kiss, Regina Duarte, Theresa Amayo, Maria Zilda, Elizabeth Savala e Ana Paula Arósio são donas do timbre doce e macio, grave e tranqüilo que emociona, revela ternura, tristeza e nostalgia da voz de veludo. E a voz de prata? Suave, clara, delicada para momentos de lirismo, delicadeza, ingenuidade e graça é o padrão de Leandra Leal, Cleo Pires, Maria Helena Pader, Lídia Brondi, Beatriz Segall, Suzana Faini, Irene Ravache e Nívea Maria. A voz cavernosa é aquela do Gil Gomes, Sargentelli e do locutor do “Nada Além da Verdade”. Arrepiante!

Se o pintor utiliza tons fortes e fracos, meios tons e aquarela de cores no ofício, na sonoridade o ator faz a comunicação do discurso. Titãs da interpretação sabem que as palavras têm o som do sentido que as contêm. Cada termo tem expressividade específica. Experimente repetir os vocábulos água...água; ou fogo...fogo. Eles “se parecem” com o sentido que transmitem. Os profissionais de excelência utilizam as pausas das vírgulas, os estudo do subtexto (o que está na cabeça do ator quando ele emite uma fala). Os aspectos técnicos remetem à boa dicção, modo de interpretar, às pausas respiratórias, inflexões e até aos silêncios. E desde a pré-história e na Antiguidade a linguagem oral foi o principal meio de comunicação. Exercícios respiratórios e técnica vocal são ferramentas básicas do ator que precisa fingir para dizer com a sinceridade do personagem.Complexo.

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Ao vivo, aparição milagrosa e modelo de promessa


A presença dos ídolos da televisão, cinema ou rádio, em tempo real, representa um carrossel de emoções. A revelação pública faz parte do sobrenatural vivido no momento que acontece. Quando as fãs encontram seus ídolos gritam, desmaiam, são combustíveis dos programas de auditório, fazem plantão na portas dos hotéis ou são descobertas debaixo da cama dos artistas, o que acaba gerando algum bebê meses depois (sic). Estar presente é estar vivo.

No rito religioso as aparições de santos e a transmutação divina sustentam a fé, a crença no milagre que fascinam o imaginário popular. São Tomé precisou tocar as chagas de Cristo para crer. Estar aqui, estar de verdade e dando o testemunho, promove envolvimento e alívio.

Sair da lâmpada do Aladim e revelar-se ao vivo dá ao personagem da mídia status divino e aumenta o faturamento. Os cachês dos astros mediáticos, para presença vip em festas, são significativos. Dos deuses. Atribuição do divino ao mortal: o “homem iluminado”.A pesquisa no Google remete a 12.500.000 citações para “ao vivo”. Ufa! Na Internet, a anarquia midiática, os canais de difusão em tempo real crescem em progressão geométrica. Até o sexo virtual explode na webcam.

A primeira transmissão em tempo real aconteceu em 25 de junho de 1967, na BBC, com o pool de emissoras e o conjunto The Beatles com a música All You Need is Love, que diz “tudo o que você precisa é de amor”. Isso, o telespectador precisa de amor...Quer amor maior que falar ao pé do ouvido da audiência?

As entradas, ao vivo, das emissoras de TV ressuscitam lembranças e remete ao rádio e impactantes transmissões a distância de outros momentos. Reportagens diversas, futebol, carnaval, a copa do mundo, as olimpíadas, as guerras, os velórios espetaculares e tragédias recebem a garantia de selo de qualidade. São bem-vindos e cativam. Essa credibilidade tem certificação no que François Jost chama de “Modelo de Promessa” pois “nas emissões ao vivo, existe uma promessa de autenticidade maior que em outros tipos de programas. Nesses programas, aparece na tela a indicação do vivo para chamar a atenção para essa promessa”. Mas, às vezes, pode não ser. A programação é garantida e influenciada pelo testemunho dos apresentadores, que dão o aval da autenticidade e verdade. Os pequenos atrasos, percebidos pela audiência, são necessários para se ter controle do conteúdo. Para garantir lugar no imediatismo tem que ser ocorrência rara, exótica, edição extraordinária, sem os clichês cotidianos dos noticiários. Atração de circo.

Foi o ao vivo que fez a diferença e mudou a história da TV Globo, que em 10 de janeiro de 1966, transmitiu as enchentes que castigaram o Rio de Janeiro. Uma câmera ficou ligada a noite toda em direção ao morro onde a enxurrada caudalosa inundava a cidade maravilhosa. A então TV Globo cobriu ao vivo, conquistou o povo do Rio e “passou a ser a mais carioca das emissoras”. A tragédia exibida ao vivo inspirou uma campanha de solidariedade e motivou a população a doar tudo. A emissora superlotou de doações. Como no “Criança Esperança” que também é ao vivo, nos permite estar com os ídolos aqui e agora e somos quase intimados a doar. O dízimo eletrônico.

Homem na lua e velórios

A chegada do homem à lua, em 1969, foi um marco do rompimento de distância, via satélite. O homem na lua, no céu, perto de Deus, via TV. Estar na TV é estar perto de Deus? A transmissão de velórios e sepultamentos ao vivo pára o Brasil.Foi assim com Tancredo Neves, Leonardo, Airton Senna e Mamonas Assassinas. A voz de bronze de Fábio Perez completa a emoção. A cobertura dos atentados de 11 de setembro promoveu estado de choque entre realidade e ficção. Sabe-se que na França, muitas crianças entenderam que havia 18 aviões, por causa da maciça repetição da cena. Recentemente dezenas de câmeras acompanharam a reconstituição do assassinato de Isabela Nardoni. A rede do pastor ficou o dia inteiro no ar, ao vivo, mostrando a janela do apartamento, a tela cortada, os peritos e suas luvas de plástico e a boneca fetiche da menina que balançava, balançava e não caía...E a platéia gritava para evitar a “nova” tragédia.

A gravação chega requentada. É arquivagem. O vivo tem o frescor do pastel que acabamos de fritar, do desafio do teatro, grande celeiro da TV, onde não se pode errar, gaguejar, ou como aconteceu com Zileide Silva, no Jornal Hoje, soltar a lente de contato e não ler o telepromper, o aparelho que permite a reprodução do script sobre a câmera facilitando a leitura do apresentador e que dá a sensação de olhar diretamente para o telespectador.Talvez o “ao vivo”, a interação, seja a saída das emissoras de TV no enfrentamento da dispersão da audiência para o mundo ciberespaço.