sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Ao vivo, aparição milagrosa e modelo de promessa


A presença dos ídolos da televisão, cinema ou rádio, em tempo real, representa um carrossel de emoções. A revelação pública faz parte do sobrenatural vivido no momento que acontece. Quando as fãs encontram seus ídolos gritam, desmaiam, são combustíveis dos programas de auditório, fazem plantão na portas dos hotéis ou são descobertas debaixo da cama dos artistas, o que acaba gerando algum bebê meses depois (sic). Estar presente é estar vivo.

No rito religioso as aparições de santos e a transmutação divina sustentam a fé, a crença no milagre que fascinam o imaginário popular. São Tomé precisou tocar as chagas de Cristo para crer. Estar aqui, estar de verdade e dando o testemunho, promove envolvimento e alívio.

Sair da lâmpada do Aladim e revelar-se ao vivo dá ao personagem da mídia status divino e aumenta o faturamento. Os cachês dos astros mediáticos, para presença vip em festas, são significativos. Dos deuses. Atribuição do divino ao mortal: o “homem iluminado”.A pesquisa no Google remete a 12.500.000 citações para “ao vivo”. Ufa! Na Internet, a anarquia midiática, os canais de difusão em tempo real crescem em progressão geométrica. Até o sexo virtual explode na webcam.

A primeira transmissão em tempo real aconteceu em 25 de junho de 1967, na BBC, com o pool de emissoras e o conjunto The Beatles com a música All You Need is Love, que diz “tudo o que você precisa é de amor”. Isso, o telespectador precisa de amor...Quer amor maior que falar ao pé do ouvido da audiência?

As entradas, ao vivo, das emissoras de TV ressuscitam lembranças e remete ao rádio e impactantes transmissões a distância de outros momentos. Reportagens diversas, futebol, carnaval, a copa do mundo, as olimpíadas, as guerras, os velórios espetaculares e tragédias recebem a garantia de selo de qualidade. São bem-vindos e cativam. Essa credibilidade tem certificação no que François Jost chama de “Modelo de Promessa” pois “nas emissões ao vivo, existe uma promessa de autenticidade maior que em outros tipos de programas. Nesses programas, aparece na tela a indicação do vivo para chamar a atenção para essa promessa”. Mas, às vezes, pode não ser. A programação é garantida e influenciada pelo testemunho dos apresentadores, que dão o aval da autenticidade e verdade. Os pequenos atrasos, percebidos pela audiência, são necessários para se ter controle do conteúdo. Para garantir lugar no imediatismo tem que ser ocorrência rara, exótica, edição extraordinária, sem os clichês cotidianos dos noticiários. Atração de circo.

Foi o ao vivo que fez a diferença e mudou a história da TV Globo, que em 10 de janeiro de 1966, transmitiu as enchentes que castigaram o Rio de Janeiro. Uma câmera ficou ligada a noite toda em direção ao morro onde a enxurrada caudalosa inundava a cidade maravilhosa. A então TV Globo cobriu ao vivo, conquistou o povo do Rio e “passou a ser a mais carioca das emissoras”. A tragédia exibida ao vivo inspirou uma campanha de solidariedade e motivou a população a doar tudo. A emissora superlotou de doações. Como no “Criança Esperança” que também é ao vivo, nos permite estar com os ídolos aqui e agora e somos quase intimados a doar. O dízimo eletrônico.

Homem na lua e velórios

A chegada do homem à lua, em 1969, foi um marco do rompimento de distância, via satélite. O homem na lua, no céu, perto de Deus, via TV. Estar na TV é estar perto de Deus? A transmissão de velórios e sepultamentos ao vivo pára o Brasil.Foi assim com Tancredo Neves, Leonardo, Airton Senna e Mamonas Assassinas. A voz de bronze de Fábio Perez completa a emoção. A cobertura dos atentados de 11 de setembro promoveu estado de choque entre realidade e ficção. Sabe-se que na França, muitas crianças entenderam que havia 18 aviões, por causa da maciça repetição da cena. Recentemente dezenas de câmeras acompanharam a reconstituição do assassinato de Isabela Nardoni. A rede do pastor ficou o dia inteiro no ar, ao vivo, mostrando a janela do apartamento, a tela cortada, os peritos e suas luvas de plástico e a boneca fetiche da menina que balançava, balançava e não caía...E a platéia gritava para evitar a “nova” tragédia.

A gravação chega requentada. É arquivagem. O vivo tem o frescor do pastel que acabamos de fritar, do desafio do teatro, grande celeiro da TV, onde não se pode errar, gaguejar, ou como aconteceu com Zileide Silva, no Jornal Hoje, soltar a lente de contato e não ler o telepromper, o aparelho que permite a reprodução do script sobre a câmera facilitando a leitura do apresentador e que dá a sensação de olhar diretamente para o telespectador.Talvez o “ao vivo”, a interação, seja a saída das emissoras de TV no enfrentamento da dispersão da audiência para o mundo ciberespaço.

Um comentário:

Mayla Martins disse...

Oi meu querido professor! Dízimo eletrônico é ótimo...parabéns pelo trabalho e também por estar escrevendo no Certas Palavras. Já passei por lá e conferi o seu texto...sucesso pra vc...bjocas.