sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Bruxaria no olhar da câmera


A cena protagonizada por Jéssica Yellin, nos estúdios da CNN, quando surgiu ao vivo, em 3D, na conversa com o apresentador Wolf Blitzer continua provocando encantamento. A tecnologia fazendo o humano virar anjo que anuncia “Glória a Deus nas alturas e paz na Terra aos homens de boa vontade”. Não seria a repórter o anjo que traz a boa nova, em forma irreal, de outra dimensão, anunciando que é a hora dos homens terem boa vontade por aqui?

O texto busca o tecido das citações de Lee Manovich, The language of new media, livro inédito no Brasil, que revela a magia da construção de novos conteúdos na telinha, o ecrã. Segundo o autor a arte eletrônica é baseada no princípio da modificação do sinal existente. O artista vira técnico e já não é só romântico. E a sociedade pós-moderna promove o artificialismo onde tudo é montado, composto e estruturado, como o CPF que reúne algarismos para identificar o cidadão.

Composição digital

Para produzir efeitos mágicos com efeitos de naturalidade usa-se o compositing digital que é a reunião de elementos diferentes para produzir a simulação próxima do real. Na trilogia o filme “Parque dos Dinossauros” a reunião de gramas, árvores, atores e répteis é sopa mágica, de ingredientes eletrônicos, que dá resultado final saboroso do cenário virtual imaginado pelo diretor. O mundo de sonhos (ou pesadelos) onde os dinossauros se integram naturalmente à paisagem. Depois deles vários filmes adotaram a técnica. A TV usa e abusa dos efeitos na produção.

Os estúdios de cinema de Hollywood, ou as cidades cenográficas das novelas brasileiras, geram o espaço falsificado onde o artificial é escondido para criar significados emocionais entre elementos diferentes sem revelar emendas, criando uma única forma. Também os jogos do computador e os cenários dos telejornais apresentam o mundo da falsificação. Assim como a montagem na publicidade, nos documentários e textos de computador.Manovich cita o DJ ,que mostra a seleção de elementos pré-existentes, cria formulários artísticos novos, na habilidade de juntar os sons selecionados em maneiras ricas e sofisticadas.

Vida de fachada

No Projac, da Globo ou o Recnov, da Record, as cidades cenográficas podem ser comparados com as vilas de Potemkin que o autor descreve no livro: “De acordo com o mito histórico, no fim do décimo oitavo século, a czarina Catharina II, da Rússia, resolveu fazer um passeio pelo país para observar como os camponeses vivam. O primeiro ministro e amante de Catharina, Grigori Potemkin, mandou construir vilas artificiais, de papelão, ao longo da caminho da rainha. Cada vila se constituía de fachadas de casas bonitas e atores que acenavam para a rainha. Sem deixar a carruagem Catharina retornou convencida de que todos os camponeses viviam na felicidade e prosperidade”.

A representação do conteúdo é a perspectiva do futuro. Desde que a expressão “tele” codificou o presente ausente, as relações em comunicação se alteram. É a comunicação real-time do telégrafo, telefone, telex, televisão, telescópio e a telepresença que o autor classifica como teleação.

Longe perto

Telepresença é antipresença. Como no bate papo virtual, na webcam ou nesse artigo publicado na Internet que você lê não se sabe de onde (muito obrigado pelo prestígio!). E o Google Earth? “Com o Google Earth, você poderá voar para qualquer local da Terra para ver imagens de satélite, mapas, terrenos, edifícios em 3D e até explorar galáxias no Céu. Poderá explorar conteúdo geográfico complexo, guardar os locais visitados e partilhá-los com outros utilizadores.”

Se o humano não tem que estar fisicamente presente para a afetar a realidade. cria a ilusão contra a ação. E já fazía isso antes lendo as linhas da vida categorizadas nas mãos, os mapas, o olho mágico, o buraco da fechadura, as plantas de imóveis, os modernos simuladores de vôos, o circuito interno de TV e câmeras de vigilância. Até interpretando os olhos da mulher amada.

Complexo? Não. Formidável! E Paul Virilio revela que, agora, com a câmera, cada ponto da Terra nos é acessível, pois o sistema ótico do homem limita a nossa visão além do horizonte, fazendo da terra uma grande prisão. Podemos voar...

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